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Na sequência da vitória de Obama, o assunto mais falado parece ser a “raça”. Mesmo sendo Obama filho de um queniano e de uma “branca” americana, as representações raciais americanas colocam-no na categoria “negro”. A sua mestiçagem – e a sua origem “estrangeira” – não conseguem ultrapassar o sistema da one drop rule e de uma percepção absolutamente dicotómica da cor. Mas o sucesso de Obama simboliza duas grandes transformações que estão a ocorrer na sociedade americana: o crescente cruzamento das fronteiras raciais e os bons resultados das políticas de “discriminação positiva” (na realidade affirmative action…). A última será mesmo o factor crucial, e seria bom dizê-lo alto e bom som aos conservadores que – lá e cá – gritam contra programas desse tipo, (incluíndo contra a paridade no caso do género). Seria bom dizê-lo alto e bom som também aos supostos progressistas que acham que qualquer política “comunitarista” é necessariamente um atentado ao princípio da cidadania individual. Desde 1977, quando comecei a frequentar os EUA, tenho assistido à consolidação de uma classe média negra, da presença de estudantes negros nas universidades de qualidade e, consequentemente, ao surgimento de negros em tarefas com prestígio e visibilidade e ao aumento exponencial de sociabilidades através da linha da “raça”. Quem pensa que o racismo - ou qualquer outra discriminação - se supera só com boa vontade e desejos piedosos… que pense outra vez.

 

A vitória de Obama foi um acontecimento histórico. Como dizia alguém numa SMS que circulou nos EUA, “Rosa Parks sentou-se para que King pudesse marchar e King marchou para que Obama pudesse voar”. Mas mais importante que isto é o fim da era Bush. Junto com “A crise”, prenuncia o fim dos anos de neo-liberalismo e neo-conservadorismo em que vivemos desde Reagan e Thatcher e que foram agravados pela tomada de poder do bando Bush (nada como uma boa linguagem maoísta para definir esta gente – e não esquecer de incluir no bando os lacaios portugueses, a maior parte dos quais compreende bem esta linguagem…).

 

Todavia, tudo indica que a noite de ontem foi também trágica. Na Califórnia é bem provável que a Proposition 8 passe. Além de ser incrível que uma questão destas vá a referendo, 18.000 casais que entretanto casaram vão ser tratados como autênticos criminosos e uma mensagem de exclusão vai ser transmitida à América e ao mundo. Quando um dia uma mulher assumidamente lésbica e a sua primeira-dama entrarem na Casa Branca, então sim a eleição de Obama terá sido um prenúncio de transformações bem mais vastas, e não sectoriais. Infelizmente pouco indica que a igualdade sexual seja uma das suas causas estruturantes, pelo menos por comparação com a sua oponente nas primárias. Mas como um político nunca é só ele mesmo mas também o clima e o movimento que à sua volta se cria, vamos pelo menos dar o benefício da dúvida e… hope. (em stereO)

6 comentários

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    Inês Meneses 05.11.2008

    Fernando, repetindo-me, quase 50% da população da Califórnia não são assim tão poucos cidadãos.
  • Inês, a Califórnia é um caso muito especial nos USA.
    É claro que houve uma importante evolução entre a Proposition 22, que em 2000 teve 61% dos votos e os 51% (ainda provisórios) da Proposition 8. Eu valorizo esse facto.

    Repetindo-me: qual é que a Inês pensa que seria o resultado em Portugal, ou na Espanha ?

    Se a maioria fosse contra a Inês acha que o Governo devia impor o casamento entre pessoas do mesmo sexo ? Com base em quê ?
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    Shyznogud 05.11.2008

    Respondeu eu (mas não me quero substituir à Inês): sim, um Governo podia e devia impor o acesso ao casamento civil a pessoas do mesmo sexo. Relembro esta frase de há uns tempos ""Direitos fundamentais são contramaioritários "
  • Maria João, para esse raciocínio ser válido era necessário que a maioria das pessoas considerasse o "casamento entre pessoas do mesmo sexo" como um direito fundamental.

    Eu, por exemplo, não considero o casamento, qualquer casamento, como um direito fundamental. Para mim é apenas um tipo particular de contrato que a sociedade estabeleceu. O direito de amar e "fazer vida em comum" com quem se quiser é que me parece fundamental e inalienável.

    Sou absolutamente contra a extensão dos "direitos fundamentais" a tudo e mais alguma coisa. Isso levar-nos-ia ao esvaziamento do conceito.
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    Inês Meneses 05.11.2008

    O direito fundamental está em, perante a mesma situação (uma relação de intimidade, com uma organização e economia doméstica comum), ser tratado nos mesmos termos pela lei e pelo Estado.
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