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A relação conturbada entre religião e política no México

As reacções da hierarquia católica à recente resolução da Câmara dos Deputados mexicanos, que aprovou uma emenda à Constituição do país determinando a laicidade como princípio político do Estado, podem parecer inusitadas a um observador mais incauto. De facto, a resolução apenas acrescentará laica à definição da República mexicana, hoje descrita como «representativa, democrática e federal», o que, dada a história mexicana neste aspecto, pareceria completamente inocente - a menos, claro, que as carpiduras em relação a este singelo acrescento constitucional o sejam de facto em relação ao que simboliza.

Alterações climáticas e aquecimento global

Nope, não vou falar daqueles do IPCC, embora recomende a leitura de um artigo do Guardian de ontem, «The case for climate action must be remade from the ground upwards», que explica como, na sequência do ClimateGate e das críticas a exageros de que há bem pouco tempo a Nature nos deu conta, a «ciência do clima está sob cerco e a política do clima em desordem». O clima de que importa falar é o clima político e um fenómeno que o El Niño financeiro dos últimos tempos está a tornar global: o descrédito da política e dos políticos.

 

Assim, recomendo vivamente outro artigo em língua inglesa, o que Rachel Sylvester escreve hoje no Times, «They’re all ignoring political climate change», que poderia, sem grande esforço de adaptação, ser utilizado para descrever a situação nacional. Assim como, sem grande esforço de adaptação, o que respondi a um comentário ao primeiro post sobre o ClimateGate, descreve o que penso sobre a fuga de informação do momento em Portugal:

 

«A questão do aquecimento global transformou-se num debate político e por isso mesmo tornou-se histriónico. A verdade não parece importar aos dois lados da barricada; só importa ganhar o debate e impor um ou outro modelo de sociedade. Daí que seja tão importante a análise científica séria, e não politizada, nem instrumentalizada. E também daí que seja desastroso, nesta altura do campeonato, que se venha lançar dúvidas sobre a atitude cientificamente séria e rigorosa de alguns, e apenas alguns, dos intervenientes neste debate.

Só li alguns dos emails e, a serem verídicos, não fiquei muito bem impressionada com alguns excertos sobre peer review e retaliações editoriais sortidas sobre os denialists. Espero que não sejam verídicos porque estou certa que a serem, dado o histrionismo do debate e a sua globalização na sociedade, isso trará consequências graves para a própria ciência mas em particular para a sociedade em geral
».

 

Mais importante que tudo isto, a resposta que o opinador do Guardian nos dá para resolver a crise de credibilidade do IPCC e, por arrasto, das alterações climáticas por efeito antropogénico aplica-se praticamente sem necessidade de adaptação a estoutra alteração do clima político: é necessário que a sociedade civil, todos nós - indivíduos, organizações e empresas - deixemos de ser meros espectadores de coros dissonantes (e histriónicos), peguemos no bastão e nos envolvamos na harmonização da orquestra.

Don't be STUPID

O acrónimo PIGS (ou PIIGS) causou indignação colectiva nos visados quando foi utilizado para identificar os países europeus que partilhavam problemas de défices elevados, históricos de grandes níveis de endividamento e altas taxas de desemprego, Portugal, Itália (Irlanda), Grécia e Espanha. Reprovado pelo Finantial Times, banido pelo Barclays, foi há dias substituido por outro que designa os países que alguns consideram serão arrastados por uma eventual queda da Grécia: os STUPI(I)D - Espanha, Turquia, Reino Unido, Portugal, Itália/Irlanda e Dubai.

  

Pequeno almoço da intolerância

Ontem realizou-se mais um National Prayer Breakfast, um evento que é organizado desde 1953 por um grupo fundamentalista cristão, a Fellowship Foundation mais conhecida, muito apropriadamente, como a Família*.

 

Desde os seus primórdios, o evento conta com a presença dos mais altos políticos norte-americanos e de alguns convidados especiais (agora foi a vez de Zapatero). Este ano, no rescaldo da publicação do livro de Jeff Sharlet «The Family: The Secret Fundamentalism at the Heart of American Power» e das ligações da Família à iníqua lei que condena à morte ou a prisão perpétua os homossexuais ugandeses, vários grupos, incluindo a Americans United for Separation of Church and State, liderada pelo pastor Barry Lynn, e  a Citizens for Responsibility and Ethics in Washington pediram, sem sucesso, que os mais altos responsáveis políticos do país não legitimassem com a sua presença a intolerância e fundamentalismo da Família.

 

Neste vídeo, “Moses,”  um cidadão do Uganda que pediu asilo político aos EUA e que teme pela sua vida se for forçado a voltar ao Uganda, explica o que está em jogo, mensagem reforçada pelo reverendo Barry Flynn que detalha «What's Wrong With 'The Family' And The National Prayer Breakfast».

 

 

 

*Durante a administração Reagan floresceram as células de «Deus» instituidas por Abraham Vereide, uma rede de poder semi-clandestina em que os membros são generais, senadores, pregadores e executivos de grandes empresas, cujo objectivo é a construção do Reino de Deus na Terra com capital em Washington*.


A «Worldwide Spiritual Offensive» destas células dedica-se à expansão mundial do poder americanocomo forma de expansão do Evangelho apoiando, por exemplo, Siad Barre na Somália, Carlos Eugenios Vides Casanova em El Salvador e os esquadrões de morte salvadorenhos e, mais recentemente, Yoweri Museveni, o presidente do Uganda. Aqueles a que muitos chamam a Mafia cristã foram ainda muito activos no combate à ameaça comunista apoiando ditadores como o marechal Artur da Costa e Silva no Brasil, o general Suharto na Indonésia, e o general Gustavo Alvarez Martinez nas Honduras.

Pois e quem paga a visita papal de Maio?

A National Secular Society lançou uma petição pedindo que o Estado não suporte os previstos 20 milhões de libras que custará a visita de Bento XVI a Inglaterra - que ainda por cima parece ir ser apenas mais uma prédica papal contra os direitos dos homossexuais.

 

De facto, na conferência com dignitários das delegações britânicas da ICAR, o Papa exortou-os a lutar com «zelo missionário» contra a legislação introduzida para pôr fim à discriminação de homossexuais que «na verdade viola o direito natural» uma vez que impede os católicos de serem fiéis às suas crenças. Bento XVI acrescentou ainda que acabar com as discriminações não torna a sociedade mais equalitária, bem pelo contrário já que, segundo ele, é um ataque à liberdade religiosa.

 

Peter Tatchell, activista dos direitos humanos, resumiu as tolices debitadas pelo Papa:  «His ill-informed claim that our equality laws undermine religious freedom suggests that he supports the right of Churches to discriminate in accordance with their religious ethos.

He seems to be defending discrimination by religious institutions and demanding that they should be above the law

The Iraq Inquiry

Para perceber as motivações de Tony Blair em invadir o Iraque, vale a pena ler dois artigos, um no Guardian e outro na Times. Do último, retiro este pequeno excerto:

 

“After September 11,” Blair replied, “I realised we could not take risks with these people at all.” These people. Which people? But Tony Blair does not confuse them. He acknowledges (he did later) that Saddam had no links with al-Qaeda.

Uma suspensão da democracia?

No início de Dezembro de 2008, para evitar uma moção de confiança que derrubaria o seu governo minoritário, o 1º ministro canadiano achou por bem suspender por 2 meses o Parlamento e a democracia. Em finais de Dezembro de 2009, Stephen Harper deve ter considerado que o Parlamento é uma maçada irrelevante e prorrogou  de novo a democracia, considerando que os parlamentares só devem voltar do limbo depois de devidamente entretidos pelos Jogos Olímpicos de Vancouver, ou seja, em Março. 

 

A oposição, que detém 2/3 dos lugares da Câmara dos Comuns, não apreciou sobremaneira as medidas que o PM canadiano considerou essenciais para combater a crise, entre elas a suspensão durante três anos do direito à greve dos funcionários públicos e do direito das mulheres a salários iguais para trabalho igual. Também não considerou muito interessante a intenção da oposição de investigar a forma como o governo conservador tratou prisioneiros afegãos. Entretanto, Harper nomeou cinco conservadores para o Senado, formado por membros vitalícios indicados pelo PM, o que lhe dá maioria nesta câmara. De acordo com Harper, as nomeações dos seus colegas de partido são um passo na direcção de um Senado democraticamente eleito (?) e são necessários para o governo implementar a sua agenda do crime. Mais, considera que «The opposition have abused their Senate majority by obstructing and eviscerating law and order measures that are urgently needed and strongly supported by Canadians».

 

Sobre este assalto inesperado à democracia em terras nominalmente de Sua Majestade, vale a pena ler este artigo no Chronicle Herald.

Citação do Dia

Em Novembro, dei conta da guerra que a ICAR move à cidade de Washington devido à  legalização do casamento de pessoas do mesmo sexo. A lei foi assinada há 5 dias na igreja unitária All Souls, uma das muitas que apoiaram a medida. Vale a pena ler a declaração do Rev. C. Welton Gaddy,  autor do Same-Gender Marriage and Religious Freedom: A Call to Quiet Conversations and Public Debates, em relação a esta decisão, que foi lida pelo presidente da Interfaith Alliance como aquilo que é: uma manobra política que tenta mostrar ao público em geral que, apesar das pressões e chantagens da ICAR, a lei tem apoio religioso.

 

Another religious right bites the dust

A campanha presidencial de 2008 teve um ênfase inédito no tema religião, tão inédito que Ralph Reed, o estratega do GOP que ajudou a construir a Christian Coalition na década de 90, afirmou que «Tem havido mais fermento religioso nestas eleições que em qualquer outra desde 1960 e não espero que isso termine agora». No entanto, como a eleição de Barack Obama mostrou,  Reed, o primeiro director-executivo da Coligação Cristã na altura e agora em travessia no deserto devido ao seu envolvimento no caso Abramoff, a teia de corrupção e extorsão que abalou os Estados Unidos em 2006, estava a ser vítima de «wishful thinking».

 

Alguns dos pré-candidatos republicanos a 2012, concretamente Mike Huckabee e Sarah Palin, parecem não entender que é contraproducente dirigir a campanha para a religião. No caso de Palin, esta não tem outro remédio porque os religious right são a sua base exclusiva de apoio mas nem os seus mais fervorosos apoiantes conseguem esquecer a total vacuidade e ignorância da senhora. Mike Huckabee quer-se reafirmar como «Christian leader» mas os acontecimentos recentes são exemplo do que acontece quando se baseia a actuação política em «valores» cristãos e não na razão/valores seculares.

 

Guerras culturais

 

Sean Hannity é um dos spin doctors da Faux News tão falada hoje em dia pela crítica que a sua violenta campanha contra Barack Obama mereceu de fontes governamentais. Todas as oportunidades de vitimizar os conservadores cristãos são aproveitadas avidamente pela estação e claro que a campanha da delegação de Nova Iorque da COR (Coligação para a Razão), que pretende mostrar aos habitantes da Grande Maçã que mais de um milhão dos seus amigos e vizinhos são pessoas de «bom carácter» sem deuses, não escapou às atenções. Assim, sem pingo de vergonha na cara, o piedoso Hannity tentou inflamar  a sua audiência para mais uma guerra cultural afirmando que um grupo cristão nunca poderia levar a cabo uma campanha destas:

Can you imagine the outrage if a Christian group put pro-God ads in the New York City subways? What outrage.

Na realidade, como explica o Subway Sights, há anos que o metro de Nova Iorque está inundado de anúncios de todos os flavours do cristianismo, cada um oferecendo o seu caminho, o da Bayer, para a salvação. Mas, claro, a verdade ou a simples constatação dos factos é algo completamente arredado da Faux News, em particular nos últimos tempos, tão entretidos que andam em outras guerras...

 

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