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jugular

A arte de inventar sucessos

Os dados do emprego divulgados na passada sexta-feira pelo INE são um exemplo paradigmático de como os sucessivos "sucessos" do programa de ajustamento se revelam, afinal, uma ilusão.

Foi assim com o ajustamento externo, que depende do empobrecimento do país (quando saímos da recessão, as importações voltam a crescer mais do que as exportações); foi assim com a descida dos juros, algo que acontece em toda a periferia, incluindo a Grécia; foi assim com a chamada saída limpa, que não foi uma escolha soberana do país, mas sim o resultado dos nossos parceiros não nos terem dado alternativa. No emprego passou-se o mesmo: decretou-se um sucesso que, em rigor, não o é.

É-nos dito repetidamente que o mercado de trabalho está a recuperar e que isso prova que as reformas estruturais resultam e que a austeridade não é incompatível com a criação de emprego. Acontece que os dados do INE desmentem quaisquer ideias de retoma e de transformação estrutural da economia portuguesa.

Quando comparado com o pior período desta crise, o emprego subiu, de facto. Mas dos 72 mil empregos criados entre 1º trimestre de 2013 e o 1º trimestre de 2014, 40 mil (55%) foram nos setores O [Administração Pública, Defesa e Segurança Social Obrigatória], P [Educação], Q [Atividades da saúde humana e apoio social]).

Tudo isto são "empregos" criados ou financiados pelo Estado, na grande maioria resultantes das chamadas políticas activas de emprego (estágios, etc). Como é evidente, as políticas activas de emprego não são necessariamente negativas, não podem é ser usadas para fabricar sucessos meramente estatísticos e muito menos podem servir para sustentar a tese de que estamos perante uma retoma sector privado e um dinamismo induzido pelas famosas reformas estruturais.

Se olharmos para os dois últimos trimestres, ou seja para o período entre outubro de 2013 e março de 2014, constatamos que esse mesmo sector privado destruiu 100 mil empregos líquidos. A destruição de emprego só foi menor porque o Estado - directa ou indirectamente - interveio, atenuando (e mascarando) a dinâmica negativa do sector privado.

Se olharmos apenas para o primeiro trimestre de 2014, constatamos que há menos 40 mil empregos líquidos do que no trimestre anterior. A descida da taxa de desemprego para 15.1% não é, pois, um sucesso, como tem dito o governo e a sua claque (nacional e internacional). É, isso sim, uma enorme tragédia: a taxa de desemprego baixa, não porque haja mais emprego, mas sim porque a população activa caiu.

A haver alguma dinâmica ela não é seguramente positiva. A tal transformação estrutural virtuosa - a que pressupunha canalizar recursos para o sector dos bens transacionáveis - pura e simplesmente não existiu. Desde que este governo entrou em funções, não só se destruiu mais de 350 mil empregos, como o emprego nos setores transacionáveis caiu 14%, enquanto o de bens não transacionáveis a queda foi de 5%.

Não estamos a construir nada, e só não destruímos mais porque o Estado - essa instituição que nos dizem ser um entrave ao desenvolvimento e competitividade do país - tem sido usado como paliativo.

(artigo publicado no Expresso online)

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