A coligação que era duas
As coligações têm destas coisas: criam no espírito do pacato cidadão a impressão de que algo une os coligados. Ideias, motivos, propósitos. Valores. A coligação, pensa o pacato cidadão, fala a uma só voz. Há uma comunhão de interesses que justifica a ida conjunta às urnas. Eis os coligados dispostos a serem julgados pelos eleitores com um só projeto, um só manifesto. O pacato cidadão fica ainda mais convencido disto quando lhe falam do programa eleitoral da coligação. Pois se há apenas um programa eleitoral, e ele é da coligação, é porque os coligados partilham as ideias que colocam a votos. Isto pensa o pacato cidadão.
Eis que se fala de debates. O pacato cidadão pensa que as coligações irão avançar para os debates... coligadas. Mas que não, que não!, bradam os coligados. O pacato cidadão, pensa, que diabos! terão os coligados ideias próprias, cada um deles? Que não, que não!, vociferam os coligados! Queremos é uma oportunidade para mostrar o nosso estilo, para expor de modo autónomo a mesma ideia, apresentar diferentes perspetivas de um mesmo pensamento, distintos vetores de uma ideologia. O pacato cidadão fica apreensivo: mas querem fazer isso com mais gente no estúdio? Por que não debatem entre si, com calma? Trazer a oposição para este debate, primeiro confundia-a e depois traiçoeiramente duplicava o tempo de antena para dizer a mesma coisa. Eles querem é vencer os opositores pelo cansaço, pensa o pacato cidadão. Que escolham um porta-voz e apareçam coligados nos debates. Ou há coligação a sério ou aquilo é um regabofe, pensa o pacato cidadão.
Ao pacato cidadão, modesto, humilde, remediado, não chegam as ideias elevadas da coligação com ideias unas mas cambiantes, uma unidade que é trindade, um mistério incompreensível de fé para as mentes mais simples. O pacato cidadão aflige-se: que diabos!, se vão coligados para quê esta confusão toda com os debates? Não se coligassem. Fossem sozinhos e logo se coligavam depois das eleições.
Eis a figurinha triste que andam a fazer o PSD e o CDS, Passos e Portas, cada vez que dizem que querem ir a debates separadamente.