Cil'sisa o an'teiro
O Jorge Jesus pode dar as calinadas que lhe apetecer. O seu ofício não é esse. E os tropeções linguísticos só o vinculam a ele. Já um repórter televisivo é a cara de uma televisão. O seu trabalho inclui um desempenho correto na língua em que se exprime. A gente sabe que em Portugal ninguém quer saber disto e que é muito melhor despejar fel patrioteiro em cima de um acordo ortográfico. Mas eu cá gostava de saber quem é que seleciona os repórteres de exterior das televisões. Pelo menos, da televisão pública. E deve haver tanta coisa para fazer, é mesmo preciso escolher aquelas pessoas em concreto para entrarem em direto? No mínimo, bolas, que lhes dessem umas aulas de dicção básica e de português elementar sobre como articular duas frases sem comer sílabas, o que é concordância gramatical, um singular e um plural, um sujeito e um predicado, essas coisas difíceis. Alguém que espreite a forma escorreita como os repórteres da BBC ou da Al-Jazeera falam, e compare com a mistela das televisões nacionais.
Hoje de manhã, em direto do Centro de Saúde de Sete Rios para cobrir a greve dos enfermeiros, a jornalista da RTP Lígia de Sousa deu mais um show. Ninguém se importa, é tudo banal e fixe, não é? Mas eu cá não pude deixar de me arrepiar, sem evitar rir ao mesmo tempo, ao ouvi-la falar de azjessões (as injeções), exervixos (esses serviços), sentesaúde (centro de saúde), surgias (cirurgias) e os inevitáveis ptanto (portanto) ou "os diabetes". Retive uma frase em particular. Uma utente estava indignada por ter sido impedida de tomar a vacina - urgente, por motivos de viagem - contra a febre amarela. Ao que a repórter replica - naquela mania muito portuguesa de fazer perguntas que não são perguntas - com esta: "e é uma vacina que tem que ser feita com alguma antecedência, pra produzir algum efeito, para realmente ficar assim cuxtêmimunitário capaz de lá estar e não ter problemas no Congo, não é isso?". Haja saúde, que quanto ao resto estamos servidos.