indigência emergente, ou machete strikes again
lê-se e não se acredita. a indigência intelectual do governo português, e ainda mais do ministro dos negócios estrangeiros, é conhecida, mas nem um comunicado simples, em condições, sobre um facto tão grave como o do ataque ocorrido em frança, se consegue produzir?
ora veja-se:
às 13.27 da tarde, hora da postagem do comunicado, já estavam confirmados pelo menos 11 mortos e quatro feridos graves; no ministério dos negócios estrangeiros não percebem francês? não têm lá ninguém que siga as notícias? mas adiante, que isso é o menos.
o ataque teve como alvo um jornal e os mortos foram sobretudo jornalistas e caricaturistas. mas o governo português limita-se a lamentar 'a perda de vidas humanas' (para o caso de poder haver vidas animais, ou vegetais, a lamentar); nem uma palavra sobre a liberdade de expressão e o ataque ao jornalismo (às tantas machete, não se sabendo a nacionalidade dos criminosos, pensou 'deixa-me estar caladinho não vão ter alguma coisa a ver com angola').
a seguir, esta frase fantástica: 'espera que os suspeitos deste ato bárbaro sejam rapidamente detidos, julgados e condenados.' aqui temos um mergulho resoluto no absurdo. esperam que os suspeitos sejam detidos? 'suspeitos' ??? não quererão dizer os autores? e esperam que sejam 'rapidamente detidos, julgados e condenados'? isto quer dizer o quê, que o governo português acha que a justiça francesa é lenta? e não quer também dizer a que pena os quer ver condenados, já agora? custa assim tanto escrever 'esperamos que os autores deste acto bárbaro sejam rapidamente detidos e colocados perante a justiça'?
por fim, a cereja: 'Não havendo ainda indicação quanto à identidade das vítimas, as autoridades portuguesas estão a acompanhar a situação a partir da Embaixada de Portugal em Paris e do Consulado Geral naquela cidade, estando em contacto permanente com as autoridades francesas.' sabia-se à hora do comunicado que tinham morrido dois polícias e o resto dos mortos seriam da redacção do charlie hebdo -- aliás sabe-se disso pelo menos desde as 12.30 hora francesa. portanto o que o governo português, numa demonstração de provincianismo atroz, quer dizer com esta frase absurda, é que pode haver portugueses ou lusodescendentes entre as vítimas, e que acha que deve colocar essa hipótese como relevante num comunicado sobre um ataque terrorista a um jornal na capital de um país europeu, como se da queda de um avião se tratasse.
mau de mais para ser verdade -- e no entanto é. tão mau quanto verdade.