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Mistificações milagreiras

Veio no sapatinho e chamaram-lhe milagre. Na sua mensagem de Natal aos Portugueses, Passos anunciou a criação líquida de 120 000 empregos no ano de 2013. O sector privado estaria finalmente a levantar-se do chão (para onde havia sido atirado pelas políticas da maioria) e, depois das reformas estruturais que tornaram o mercado de trabalho mais flexível e competitivo, podia finalmente fazer aquilo para que está destinado: substituir um Estado que bloqueia o desenvolvimento do país, dar emprego (sustentável) aos portugueses e, sobretudo, assegurar a transformação estrutural de uma economia assente na procura interna e nos bens não-transacionáveis para uma outra, mais sólida, assente nos bens transacionáveis.

Os números do INE sobre o emprego entretanto publicados vieram desmentir o primeiro-ministro. Os tais 120 000 novos empregos transformaram-se subitamente em 30 000 e não foi o setor privado, nem o setor dos bens transacionáveis, quem criou emprego líquido em 2013.

De acordo com a Estatísticas do Emprego do 4º trimestre de 2013, publicadas pelo INE, dos 30 000 empregos criados em 2013, 25 000 foram no sector "Administração Pública, Defesa e Segurança Social Obrigatória". Olhando apenas para o 4º trimestre, o peso do público no total de novos empregos é ainda maior: dos 8 000 empregos criados face ao trimestre anterior, 9100 são públicos. Ou seja, sem o emprego público não teria havido criação de emprego total em cadeia (na verdade, o sector privado, em termos agregados, destruiu 1100 empregos no 4º trimestre) ou ela teria sido praticamente nula em termos homólogos. Não deixa de ser estranho ver alguém que assenta todo o seu discurso na diabolização do emprego público - que constitui um "fardo que o país não pode suportar" - vir agora celebrar um "milagre" no emprego que depende quase exclusivamente desse mesmo emprego público. Esta estranheza é ainda maior quando percebemos que estes números são conservadores. O sector "Atividades de saúde humana e apoio social", por exemplo, tem uma fortíssima componente pública direta e indireta (via IPSS) e criou, só no 4º trimestre, 16 500 empregos.

Mas a estranheza não termina aqui. Não só os números desmentem a narrativa de Passos sobre o dinamismo do setor privado, como, olhando para a composição do emprego nesse setor, não se vislumbram sinais dessa tão falada transformação estrutural. A Indústria e a Agricultura, sectores tipicamente transacionáveis, viram o emprego cair 27300 e 52 800, respetivamente; e o "Comércio por grosso", uma atividade quase exclusivamente dedicada ao mercado interno (aquele que Passos quer reduzir, por contribuir para que os portugueses vivam acima das suas possibilidades) criou 23 800 empregos.

Grande parte dos empregos públicos que têm sido criados, como é evidente, só por convenção estatística se podem considerar empregos: são estágios, trabalho obrigatório (muitas vezes não remunerado) para quem recebe prestações sociais e toda a parafernália das chamadas políticas ativas de emprego. Quanto à transformação estrutural, ela pura e simplesmente não se vislumbra nos números do INE. Para além da emigração (mais de 250 mil) e dos desmotivados (275 mil que não entram nas estatísticas do desemprego), que, se contabilizados, poriam a taxa de desemprego muito acima dos 20%, sabemos agora que o anunciado milagre no emprego resume-se, afinal, a (mais) uma enorme mistificação.

Artigo publicado no Económico

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