A revista Sábado tem ido ao Arquivo da PIDE/DGS na Torre do Tombo consultar os ficheiros dos candidatos à Presidência da República, nomeadamente de Cavaco Silva e Manuel Alegre. Ou seja, 36 anos depois da extinção da polícia política do regime ditatorial de Salazar e Caetano, os arquivos da PIDE/DGS estão a servir como arma de arremesso político. Desde 25 de Abril de 1974 que se temia que isso pudesse acontecer, bem como se receava que os arquivos servissem uma nova polícia política eventualmente criada.
Para os esquecidos e os ignorantes do nosso passado recente, lembro um pouco a história polémica desses arquivos. O golpe militar de 25 de Abril de 1974, em Portugal, abriu a chamada uma nova vaga dos processos de democratização da Europa do Sul, dando lugar a uma crise revolucionária de Estado, em que ocorreu, em simultâneo, a democratização e a descolonização. Foi uma transição para a democracia por ruptura, que provocou uma forte mobilização anti-ditatorial, determinante para a imediata dissolução das instituições conotadas com o regime deposto.
Na primeira linha desse desmantelamento, esteve, por exigência dos elementos que se tinham oposto à ditadura, o aparelho repressivo - a Polícia Internacional e de Defesa do Estado/Direcção-Geral de Segurança (PIDE/DGS) -, que foi desde logo objecto da revindicação da criminalização dos seus agentes, funcionários e informadores. Ligada à questão da criminalização esteve também a discussão sobre o destino dos arquivos dessa mesma polícia política.
«A maioria dos jornalistas acredita que todas as perguntas são legítimas. Sobretudo aquelas que eles fazem aos outros.
Digo isto porque nunca conheci um único que demonstrasse gostar de ter visto aplicadas a si próprio as mesmas regras que advoga para o resto do mundo.
Por exemplo, se corre o rumor de que um determinado jornalista deve obediência a uma qualquer organização secreta, ele não apreciará ter de dar resposta. E poderá indignar-se, claro. Se, por outro lado, estiver a ser colocada em dúvida a sua orientação sexual ou a honestidade pessoal e profissional, ele provavelmente achará ofensivo. E irritar-se-á, naturalmente.
Alguns jornalistas, como se viu no caso da intentona das "escutas a Belém", entendem até que aquilo que escrevem e mandam fazer, em ordens de serviço objectivas, são "correspondência pessoal". Mas essa tese não se aplica à documentação interna de um ministério, de um clube, de uma empresa. Esse material, se for caso disso, pode ser sempre conhecido em nome do interesse público!»
Ao contrário do que os do costume têm gritado — ao ponto de mal se ouvirem —, Crespo saiu do JN pelo seu pé. Confrontado pelo seu director com o facto de a sua crónica de opinião ter pouco de opinião, Crespo "decidiu retirar o texto de publicação e informou que cessava de imediato a sua colaboração com o jornal". Ou seja, Crespo, e muito bem, resolveu autocensurar-se. A autocensura é algo muito recomendável e todos a devíamos exercer amiúde. Talvez assim o ambiente ficasse mais respirável.
NOTA: este texto não será publicado no site do Instituto Sá Carneiro. Se tal acontecer, garanto desde já que não sei como ele lá foi parar.
"Esta história nasceu porque alguém diz que alguém lhe disse que acha que ouviu alguém dizer alguma coisa na mesa ao lado num restaurante. Toda a gente compreende que isto não é assunto. Nós já não estamos falar nem de opinião nem de jornalismo. Estamos a falar de mexericos."
Segundo nota da Direcção do JN, Mário Crespo cessou a sua colaboração aquele jornal após o respectivo Director lhe ter dado “conta das dúvidas que lhe causava o texto que Mário Crespo enviara para publicação no dia seguinte”. Ainda de acordo com a mesma nota, o director do JN entendeu que “o texto de Mário Crespo não era um simples texto de Opinião mas fazia referências a factos que suscitavam duas ordens de problemas: por um lado necessitavam de confirmação, de que fosse exercido o direito ao contraditório relativamente às pessoas ali citadas; por outro lado, a informação chegara a Mário Crespo por um processo que o JN habitualmente rejeita como prática noticiosa; isto é: o texto era construído a partir de informações que lhe tinham sido fornecidas por alguém que escutara uma conversa num restaurante.”
Em face disto, Mário Crespo decidiu “retirar o texto de publicação e informou que cessava de imediato a sua colaboração com o jornal, o que a Direcção do JN respeita”.
O texto que toda a gente já conhece e que aqui não linko padece efectivamente das faltas apontadas. De acordo com o escrito, o PM e dois Ministros estariam num restaurante a discutir a forma de resolver um problema chamado Mário Crespo. E tudo isto, segundo Mário Crespo, “sem fazerem recato”, de maneira a que a urdidura pôde ser ouvida nas mesas do lado. Vou repetir: o PM e dois Ministros discutiam, num restaurante, a forma de colocar Crespo fora-de-jogo. Baixinho? Não! Incomodando a gente do lado com a sua colérica conversa. Vou repetir uma vez mais: PM e dois Ministros decidem, em conversa num restaurante, tramar o jornalista Mário Crespo. Segundo testemunhos, o tom de voz era tal que várias pessoas sentadas nas mesas do lado puderam ouvir a conversa.
E o extraterrestre do director do jornal atreve-se a colocar reservas à publicação de tal coisa. Em vez de espetar logo com a novidade na primeira página, de fazer uma dupla edição, o tonto achou que talvez não fosse má ideia fazer aquilo que um jornalista costuma fazer: investigar, confirmar, confrontar testemunhos, deixar os visados exercer o contraditório, dar ao tal PM e aos tais Ministros a possibilidade de reagirem à notícia. Assim uma cena tipo básica que qualquer jornalista tem de fazer em face de qualquer "facto" aspirante a notícia. E mais ainda quando a coisa é tão escabrosa como a descrita.
Crespo, bem mais sabido, terá achado que as tais pessoas incomodadas (com o escarcéu do PM e dos Ministros, está bom de ver) chegavam bem. Que aquilo que ele escrevia no JN até era uma coluna de opinião e que portanto qualquer notícia — aquilo é uma notícia, e que notícia! — ali dada passaria com a mesma agilidade com que tem passado a opinião.
Não foi assim e ainda bem que não foi assim. Entretanto, o lado dos maus passa a ter mais um título de respeito (bem-vindo, JN), o socialismo criou mais um mártir e o texto censurado pode ser lido em qualquer blogue e em qualquer jornal perto de nós. Nada de anormal, como nem sequer é anormal o facto de os nossos Ministros censores planearem os seus golpes de corte e costura em pleno restaurante. Tudo às claras, estilo neo-censura. Sem nada para esconder.
Depois de dois dias sem rede (auto-disciplina e não problemas de acesso) hoje, depois de pôr as leituras em dia, resolvi espreitar o Twitter para ver quais os assuntos mais falados. Entre eles encontrei a hashtag Jan Moir, que resolvi pesquisar.
Descobri imediatamente que a aparente popularidade da opinadora do Daily Mail se devia às piores razões. Jan Moir aproveitou a morte de Stephen Gately, tornado famoso primeiro com a Boyzone e depois com a sua saída pública do armário - um inédito para um membro de uma boys band -, para escrever um artigo pseudo-moralista e homofóbico que está prestes a bater todos os recordes de queixas à autoridade competente, a Press Complaints Commission (PCC). A spin doctor do Daily Mail resolveu dar largas à sua imaginação efabulando sobre as causas da morte da pop star, que recusou deverem-se a um problema genético, insinuando que a verdadeira causa da morte se encontrava «Under the carapace of glittering, hedonistic celebrity, the ooze of a very different and more dangerous lifestyle has seeped out for all to see».
Este estilo de vida muito diferente e perigoso, um sinónimo para Moir de homossexualidade, segundo a iluminada senhora «stikes a blow to the happy-ever-after myth of civil partnerships» esclarecendo imdiatamente que se referia às uniões de facto homossexuais: «Gay activists are always calling for tolerance and understanding about same-sex relationships, arguing that they are just the same as heterosexual marriages.»
Refiro-me à crónica de hoje (infra reproduzida em ver mais) do João Marcelino - A deontologia e as suas "fontes". Escola de jornalismo que se preze não a pode ignorar. Trata-se ali da diferença entre o jornalismo e a ardinice rasca - todo um mundo. O Diário de Notícias, pela mão de Marcelino, (re)assume-se de vez, nestes tempos que correm, como "o" jornal com "o hábito das informações escrupulosas e sérias", como a ele se referia o Eça, numa das suas Farpas(aquela dirigida a um juiz de Gouveia que havia condenado um marido que matara a mulher - "partindo-a aos pedaços" - a ... varrer as ruas de Gouveia).
Demasiado ocupado com o meu tacho – os prazos judiciais recomeçaram a contar –, não tenho tido tempo para escrever por aqui. Mas as notícias do dia – deste dia – ressuscitam qualquer um, maltratando todas as desculpas de bom trabalhador.
Como fiz questão de "avisar", votei em Aníbal Cavaco Silva nas últimas presidenciais – assim como, desde que tenho tempo (na acepção do de vida) para ir às urnas, votei sempre em Aníbal Cavaco Silva. Hoje, 18 de Setembro de 2009, sinto um sabor a podre. Como se as “minhas” “vividas” (assim mesmo, com quatros aspas) urnas de voto se tivessem transformado nas do tipo que albergam corpos e levam terra e água benta em cima. Ad aeternum.
Começo pelas questões de deontologia jornalística – e é triste quando a propósito de um Presidente da República se começa por aqui. Será legítimo a um jornal revelar a fonte de outro jornal? Será que a fonte de um jornal obriga outro jornal – no sentido de este não poder fazer notícia da sua revelação?
Ouvi hoje, entre a sala e a cozinha, José Manuel Fernandes dizer a Ana Lourenço, na SICN, qualquer coisa como “em tempo de eleições somos mais cuidadosos”. Nem me vou dar ao trabalho de me armar em Pacheco Pereira e recolher uma boa centena de exemplos que seriam prova cabal do tal “cuidado” – coisa que até pode ter uma leitura curiosa, que me dispenso de escalpelizar. José Manuel Fernandes, em tempo de eleições, mantém-se igual a ele próprio, como quem tem uma missão. "Cuidadoso". O tal “cuidado” que levou o Público a manter em carteira uma cacha durante ano e meio (“cuidado”, que ainda não é a altura), o tal “cuidado” que levou – lembro-me avulso – o Público a destacar, esta semana, na edição online, as “surpreendentes” declarações do líder da JSD, em detrimento da “bomba” do dia (os votos a 25 euros). O mesmo “cuidado” que leva José Manuel Fernandes a twittar como quem cavalga sem freios – anunciando o que vem por aí, como se se abeirasse o apocalipse (mas são notícias de virar de esquina) –, como se o futuro (dele? do mundo? stricto sunsu?) dependesse disso. Exactamente o mesmo “cuidado” que levou José Manuel Fernandes a anunciar, aquando da intervenção do Provedor do jornal (Público) na semana passada, que a verdade – uma espécie à la – havia de vir ao de cima. E veio, mas via Diário de Notícias.
Soube-se hoje que José Manuel Fernandes, com tanto “cuidado”, vai sair do Público depois das autárquicas. A notícia está mal dada. O Público é que vai sair de José Manuel Fernandes, que este já acumulou penas suficientes (amores, amores e odios), daquelas que entroncam as asas, para ir longe. Quiçá além fronteiras.
Voltando à questão das fontes. Como é óbvio, as fontes são pessoais e intransmissíveis e só obrigam a quem delas se serve. A revelação da fonte de um jornal por outro jornal não só é admissível, como pode ser recomendável – ainda para mais quando as fontes são como que uma espécie de trombetas do diabo (na acepção queirosiana - lembram-se do Palma Cavalão? Do nosso vizinho Dâmaso?). Desmascará-las é dever de ofício jornalístico. E este caso das “escutas” é o melhor exemplo. Marcelino está de parabéns – é preciso ter tomates.
Ouvir hoje José Manuel Fernandes – jornalista feito notícia – agoniou-me. O homem parecia que tinha acabado de cair num planeta sujo, com o dever de o limpar – e sozinho. Quem o ouvisse, sem o conhecer, quase que acreditaria na dor que lhe invadia a alma. A deontologia, ai a deontologia (aquela de que nos “alembramos” nas horas más).
E Aníbal Cavaco Silva? Nada a apontar. Votei, enganei-me, retracto-me. O problema foi meu. É meu! À minha consciência acrescentou-me uns quilos – o Presidente. Ao dizer que não se intromete, fá-lo. Pelo simples facto de o dizer. Mas, como que de aviso, atira que depois das eleições falamos. E a minha consciência entra em obesidade mórbida. Falaremos sim. Eu e uns milhões – que a explicação que a excelência ora não deu fica em débito.
"Obama escreve hoje no i sobre o seu plano de saúde universal. O mais relevante é a sua preocupação de proporcionar mais escolhas aos americanos. Eis a esquerda que sabe o que é verdadeira justiça social"