I love Lisbon, in the Spring
Eu gosto de Lisboa (ou o resto do país) na Primavera. Quando vi hoje o Tejo, a luz, o calor e as pessoas hoje, num domingo (que até não gosto), lembrei-me de uma frase do filme de Claude Chabrol, Violette Nozière, em que esta – a personagem principal, a última mulher que, no regime de Vichy e em França, foi guilhotinada, por ajudar mulheres a abortar – no caminho da cela, para o cadafalso, olha paro o sol e pensa que ele está a mais e que é um desperdício.
E se o que estivesse a mais era o facto de ela ser executada por um regime que erigia a família como o cume da sua ideologia, sem possibilitar a vida em família, para quem a desejasse? Parece-me que é isso. Hoje bem disse, ou disse bem, do sol de Lisboa, e pensei que era um desperdício aqueles que não deixam gozá-lo.
É também, já agora, um desperdício haver pessoas que têm aquilo que os alemães – reconheço o gosto pela língua alemã – chamam de «Schadenfreude». Não há como os alemães para inventar palavras, combinando-as, misturando verbos com substantivos. Neste caso, trata-se, numa tradução literal, do «prazer (Freude) de provocar dano (schaden) a alguém». Nunca percebi como se pode ter esse tipo de prazer, que não se confunde com a inveja, em cuja teia ninguém está imune de se envolver, mas que existe, existe.
Os últimos anos, em Portugal, para além da mentira e do pensamento único, há aqueles, e que têm voz, se deleitam com esse tipo de “sentimento”. São aqueles que dizem: «eles» (os portugueses), «os indígenas», ou «aquela gente», como tanto gosta de qualificar um conhecido indivíduo que perora na televisão (às segundas) e se vangloria de sempre ter dito que Portugal (e os portugueses) estavam condenados. Quando tanto se diz, num determinado momento, até se pode ter razão. Mas o que os move é precisamente (não há palavra em português) - «Schadenfreude».
Tudo isto para dizer que gosto, adoro Lisboa na Primavera, com sol e calor, e que nada disso é desperdício. Está aqui para que tenhamos prazer com ela Todos, cada um e cada uma à sua maneira, desde que isso seja (e se torne) possível.