Voilá, parece querer dizer o zézinho bastos (billy boy em português) a apontar para a gotinha azul, com ar sorridente (só não percebo o cabelinho na careca). É um zézinho como o rato Mickey, só tem 4 dedos em cada mão, embora se assemelhe mais ao Mancha Negra. A gotinha parece de água, não sei se o coiso pinga. Ladies and gentlemen: more lubrication, natural sensation e, para quem não ficar convencido, extra lubricated. E para tirar qualquer dúvida ao mais cético empedernido, o certificado final de eficiência, segurança, superavit e fiabilidade: 100% Made in Germany. 100%!, não fosse alguém pensar que uma pequena percentagem da manguinha de látex saísse de um qualquer país sem crédito nos mercados internacionais. Oh as plantações de borracha da Baviera... That's my Boy Bill.
Como Baileys não, mas como bombons (com 20% de desconto e tudo) ainda marcharam algumas embalagens, se calhar. Classic, sensitive ou fruity, categorias capazes de despertar a gula de qualquer um, sobretudo a última, como se vê pela quantidade disponível.
Recordo uma velha conversa de juventude com um familiar meu que teimava em afirmar que uma certa discoteca na zona Centro, dizia, "é considerada a melhor do país", ao que eu respondia, repetidamente, "considerada por quem? por ti e quem mais?", e esta alternância divertia-me tanto quanto o irritava a ele. A estratégia, já se sabe, é velha e básica: apontar para terceiros, alegadamente imparciais mas mais ou menos indefinidos, a chancela de sancionar as nossas próprias opiniões e interesses. Todos nós pisamos o risco informalmente uma vez ou outra, quando estamos numa conversa mais animada. Qualquer político o faz quando fala dos "portugueses" ou do "país". E as empresas, evidentemente, também. E quanto maior, mais descarada é a estratégia, e risível o resultado. Que o Continente diga que tem os preços mais baixos, pague a atores e atrizes para venderem o peixe do Belmiro com pseudo-feiras da agricultura ou alimentação saudável, ainda vá que não vá. Agora que falem de um "estudo independente" para vencer a concorrência, assim a seco, cheira um bocadinho a descaramento a mais. Não é esticar um bocadinho demais a corda do barrete pró povinho? Ao menos podiam fingir que tinham feito um estudo e pago para ser "independente" (desde que o resultado, como é óbvio, dissesse que o Continente "é o mais barato").
Garden's flower também era bem achado. Sempre podia levar algum turista a pensar que o coiso era destilado de alguma margarida exótica very typical. Ainda por cima, em inglês, "garden" dá para jardim e para horta, sempre podia haver alguém mais atrevidote que fosse levado a pensar que fosse alguma flower of Eden. Ou achasse que era alguma reminiscência daquele prato português muito característico que servem no Allgarve, como é? Ah chicken piri piri. A gente por cá em geral, e eu em partiular, é que não está bem a ver por que epifania bizarra alguém chama "flor das hortas" a um picante, daqueles banais, apodado de "piri-piri" com hot sauce a rematar. Seja como for, eu passei a usá-lo amiúde, em praticamente tudo, desde o café com leite ao bacalhau com batata a murro. Sobretudo quando vejo sondagens sobre intenções de voto partidário. Não sei porquê, acho adequado, tanto o escaldão como a surrealidade.
Há negócios que nunca deveriam ter o nome de família. Ou famílias que deveriam evitar certos negócios. Não é por nada, mera precaução e prudência. Um produtor de azeite de apelido Oliveira, uma família Pereira com grandes pomares, são ouro sobre azul. Já uns Santos Bicho podiam dedicar-se, exibindo orgulhosamente os costados, às desinfestações, à zoofilia, sei lá, a tanta coisa. Agora ao negócio de aperitivos? Ainda por cima, dá a ideia de que os amendoins contêm gorgulhos abençoados.
Esta já tem algum tempo. Nunca calhou dedicar-lhe uns segundos a parar, apontar e disparar. Na verdade, não tem nada de especial. Mas sempre me fez esboçar um sorriso, de cada vez que lá passo, verificar a sã e tranquila parceria entre as duas entidades. Pode ser um prenúncio dos tempos que se avizinham. Que tal a Goldman Sachs ocupar uma ala do Palácio de Belém ou ceder uma parte de S. Bento para o Deutsche Bundesbank abrir um balcãozinho?
Lembro-me de, há já uma dúzia de anos, uma cadeia nacional de fastfood ter substituído a palavra hamburger por "bife picado". Havia uma, ali nos lados do Rossio. De cada vez que lá ia, era sempre tentado a dizer "queria o meu bife não picado desta vez, por favor", a ver se alguém tinha coragem de me mostrar o pedaço de carne, vísceras e gordura bovina que dera origem ao cilindrozinho achatado que me aparecia no prato, devidamente entalado no pão e saturado de molhos, queijo e alface. Anos depois, foi com espanto que verifiquei que esta tentação de dourar a pílula, melhor dizendo, branquear o lixo alimentar, não tinha desaparecido. Nada de jogadas sofisticadas de marketing ou de operações de charme. Nada disso. Basta mudar o nome e está feito. Num supermercado da mais célebre cadeia nacional de venda a retalho, verifiquei que não se vende margarina. Margarina, aquele produto alimentar associado a colesterol e doença cardíaca e sobre o qual se diz estar carregado de aditivos, como "corantes, espessantes, emulsificantes, flavorizantes,acidulantes, umectantes, aromatizantes e estabilizantes". Não. Por ali há coisas que sabem a margarina, têm o preço da margarina, são marcas de margarina, podem ser utilizadas como margarina e, suspeito, fazem tão mal como a margarina. Mas não são margarinas. São "cremes culinários". Simples, não? Para mim, demasiado: passei a receber com um sorriso agridoce palavras como "retoma", "recuperação" ou crescimento", ditas e escritas por gente com mais responsabilidades do que os fazedores de etiquetas da secção de frio dos supermercados.
A alheira é o formato português para quase tudo. Faz-se de tudo, tudo lá cabe. "Encher chouriços" é uma velha e consagrada expressão nacional, designando um certo agir português, uma certa visão da realidade e do mundo. Mas um chouriço é um velho formato, desajustado às realidades presentes e aos desafios do futuro. O que está a dar é a alheira, muito mais flexível, dinâmica e adequada aos tempos de crise. É um modelo que permite todas as soluções: é encher com aquilo que se quiser, atar e fechar fechadinha, com um belo rótulo a rematar. Não precisa de mostrar o que está lá dentro, nem como foi feita, nem que bizarro critério presidiu à sua confeção. Bate, assim, a pita ou o wrap aos pontos. Afinal, toda a gente sabe que temos, por exemplo, um partido-alheira (o BE, também conhecido como "omelete de esquerda"), uma maioria-alheira (com deputados que não sabem o que fazem, e outros, o que hão-de fazer) ou um governo-alheira (mistela de políticos com tecnocratas que não sabem bem como lá foram parar nem como combinam). Temos até um presidente-alheira (que enfarda a eito e à vista, geralmente via facebook). Esta que aqui mostro é anterior a tudo isto. Andava eu à procura de uma de bacalhau com café ou de atum com meia-de-leite, mas não havia. Nem sequer de entrecosto com chocolate. Só havia esta, que não me encheu as medidas. Foram, claro, devaneios de época estival. Devia ter aproveitado o ananás com presunto, ai ai. Mal sabia eu que este outono nos reservava um OE-alheira de óleo de fígado de bacalhau.
Eis uma surpreendente gama de produtos que tive o prazer de conhecer na dita estação. Não foi numa loja da especialidade, mas num simples supermercado, anunciado em grandes parangonas. Desconheço a sua eficácia. Mas dei por mim a pensar no trabalho neuronal dos criativos das técnicas de marketing, sempre a puxar pela cabeça em busca de novos truques, para terem chegado a um resultado destes. Só pode ser da crise, que comprovadamente afeta criatividades e imaginações. O impacto no mercado deve ser chocante, estou mesmo a imaginar: "Mas que belas unhas, rica, como conseguiu?", "oh «Casco Cavalo», que mais poderia ser?"; "hmm querida, essas mãos... deixa-me adivinhar: seguiste a minha sugestão e compraste «Casco Cavalo», não foi?"; "eu roía as unhas e tinha sempre as mãos secas, mas «Casco Cavalo» mudou a minha vida". Tenho aguardado com alguma expectativa a publicidade na televisão, com cativantes imagens de estábulos e belos zooms sobre as patas equinas para deixar homens e mulheres loucos(as) para terem umas unhas assim. Ainda hei-de ver gente de ferradura em vez de sapatos, se a moda pegar. Oh e a pele, a pele... E, evidentemente, aguardo o inevitável efeito dominó, de que posso já vaticinar alguns exemplos: umas pastilhas anti-azia Bandulho de Vaca, umas lentes de contacto Olhos de Carneiro Mal Morto, um seguro Vidas de Gato, umas pastilhas para a rouquidão Voz de Gralha. Hmm e uns tratamentos anti-esterilidade Prole de Coelho, porque não? Ainda sobre os equídeos, uma pasta dentífrica Dentes de Cavalo. E, já agora, uns comprimidinhos para a disfunção erétil também inspirados no mesmo animal, não?